terça-feira, 13 de outubro de 2009


                                                          Bebês não quebram





As expressões dos bebês são sinais muito poderosos.
Sorrisos que nos encantam, choros que nos mobilizam
e trocas expressivas que nos seduzem. Nascem
prontos para amar e ser amados

Vera Sílvia Raad Bussab
Ilustração: Will

Diante de um bebezinho sentimos as mais diferentes emoções. Ficamos entre maravilhados e enternecidos. Tão encantadores, tão pequeninos e tão dependentes. Difícil resistir ao contato de seu olhar, à expressividade de seu rosto, aos apelos dos seus gestos. Ao mesmo tempo, diante de tanta fragilidade, podemos ficar um pouco inseguros. Com cerca de 3 quilos, uma grande área mole no crânio, incapazes de sustentar a própria cabeça, quase cabem dentro de nossas mãos. Evocam cuidados que convidam à reflexão. Quando se vai além das primeiras impressões, pode-se descobrir nos bebês muito sobre nós mesmos.

A comparação do humano recém-nascido com as espécies próximas acentua ainda mais a impressão de fragilidade. Nossos bebês nascem mais indefesos e menos desenvolvidos do que se espera dos primatas. Mesmo quando nascem ao final da gestação, de nove meses, os bebês parecem prematuros para o padrão dos macacos. Em termos relativos, seu cérebro está menos desenvolvido, seus ossos estão menos calcificados e várias coordenações estão ausentes. As características típicas dos recém-nascidos primatas só serão atingidas pelos bebês cerca de seis meses depois.

Quem nasce assim prematuro requer cuidados especiais. O canguru, que lá pelos seus motivos tem uma gestação curta, de cerca de cinco semanas, nasce cego, sem pêlos e com pouca maturação motora. Completa seu desenvolvimento fora do útero ficando na bolsa da mãe algum tempo. Já o elefante dispensa essa atenção. Sua gestação consome 95 semanas, mais que o dobro da nossa, e o filhote nasce, anda e corre. A indefesa espécie humana forma no time do canguru, e o colo da mãe opera como a extensão do útero.

Não se quer dizer com tudo isso que os bebês chegam despreparados para este mundo. Na verdade, revelam-se muito adaptados para o que realmente importa, desde o princípio. São capazes de familiarizar-se rapidamente, reconhecendo as pessoas individualmente, e já na primeira semana identificam a mãe pela voz e pelo cheiro. Desde o nascimento, mostram-se voltados para a interação social e para a vinculação afetiva. As expressões que os bebês apresentam são sinais de comunicação muito poderosos. Sorrisos que nos encantam, choros que nos mobilizam e trocas expressivas que nos seduzem. Espelham nossas expressões em seu próprio rosto, assim como fazemos com as deles. Nascem prontos para amar e ser amados.

O adulto, por sua vez, também está mais preparado para ser pai ou mãe do que freqüentemente imagina. Muitas vezes faz, sem se dar conta, exatamente aquilo que deveria fazer. Mesmo pessoas que dizem acreditar que bebês não enxergam se comportam adequadamente para o nível de visão da criança. É comum que, durante a interação afetuosa, a mãe ou o pai se coloquem na linha de visão do bebê, mais ou menos a uns 20 centímetros do seu rosto, exatamente a distância ideal para a acuidade do recém-nascido.

Em contraste com as visíveis incapacidades, o ser humano apresenta notáveis competências. Não somos especialmente fortes, nem rápidos, nem mesmo muito bem-acabados. Crescemos lentamente e dependemos uns dos outros de uma forma especial. Enveredamos por um modo de vida cultural altamente especializado, cuja base parece estar na convivência intensificada e no estabelecimento de laços duradouros. Em certo sentido, da extrema fragilidade humana nasce a sua força.

Vera Sílvia Raad Bussab é psicóloga e professora
do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo
Fonte : http://veja.abril.com.br/especiais/bebes/index.html

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